terça-feira, 9 de agosto de 2011

O segredo da vida de um casal- Contardo Calligaris


O segredo da vida de um casal. 

Por Contardo Calligaris
Receita do amor que dura: amar o outro não apesar de sua diferença, mas por ele ser diferente.

Em geral , na literatura, no cinema e nas nossa fantasias, as histórias de amor acabam quando os amantes se juntam (é o modeloCinderela) ou, então, quando a união esbarra num obstáculo intransponível (é o modelo Romeu e Julieta). No modelo Cinderela, o narrador nos deixa sonhando com um “viveram felizes para sempre”, que seria a “óbvia” conseqüência da paixão. No modelo Romeu e Julieta, a felicidade que os amantes teriam conhecido, se tivessem podido se juntar, é uma hipótese indiscutível. O destino adverso que separou os amantes (ou os juntou na morte) perderia seu valor trágico se perguntássemos: será que Romeu e Julieta continuariam se amando com afinco se, um dia, conseguissem deitar-se juntos sem que Romeu tivesseque escalar a casa de Julieta até o famoso balcão? Ou se, em vez de enfrentar a oposição letal de suas ascendências, eles passassem os domingos em espantosos churrascos de família?

Talvez as histórias de amor que acabam mal nos fascinem porque,nelas, a dificuldade do amor se apresenta disfarçada. A luta trágica contra o mundo que se opõe à felicidade dos amantes pode ser uma metáfora gloriosa da dificuldade, tragicômica e inglória, da vida conjugal. O casal que dura no tempo, em regra, não é tema para uma história de amor, mas para farsa ou vaudeville -às vezes, para conto deterror, à la “Dormindo com o Inimigo”.
Durante décadas, Calvin Trillin escreveu uma narrativa de sua vidade casal, na revista “New Yorker” e em alguns livros (por exemplo,“Travels with Alice”, viajando com Alice, de 1989, e “Alice, Let’sEat”, Alice, vamos para a mesa, de 1978). Nesses escritos, que são só uma parte de sua produção, Trillin compunha com sua mulher, Alice, uma dobradinha humorística, em que Calvin era o avoado, o feio e o desajeitado, e Alice encarnava, ao mesmo tempo, a beleza, a graça e a sabedoria concreta de vida.
À primeira vista, isso confirma a regra: a vida de casal é um tema cômico. Mas as crônicas de Trillin eram delicadas e tocantes: engraçadas, mas nunca grotescas. Trillin não zombava da dificuldade da vida de casal: ele nos divertia celebrando a alegria do casamento. Qual era seu segredo? Pois bem, Alice, com quem Trillin se casou em 1965,morreu em 2001.
Trillin escreveu “Sobre Alice”, que acaba de ser publicado pela Globo. Esse pequeno e tocante texto de despedida desvenda o segredo de um amor e de uma convivência felizes, que duraram 35 anos. O segredo é o seguinte: Calvin e Alice, as personagens das crônicas, não era martifícios literários, eram os próprios. A oposição entre os dois foi, efetivamente, o jeito especial que eles inventaram para conviver e prolongar o amor na convivência.
Considere esta citação de um texto anterior, que aparece no começo de “Sobre Alice”: “Minha mulher, Alice, tem a estranha propensão de limitar nossa família a três refeições por dia”. A graça está no fato de que a “propensão” de Alice não é extravagante, mas é contemplada por Calvin como se fosse um hábito exótico.
Alice é situada e mantida numa alteridade rigorosa, em que é impossível distinguir qualidades e defeitos: Calvin a ama e admira como a gente contempla, fascinado, uma espécie desconhecida num documentário do Discovery Channel. Se amo e admiro o outro por ele ser diferente de mim (e não apesar de ele ser diferente de mim), não posso considerar que minha maneira de ser seja a única certa. Se Calvin acha extraordinário que Alice acredite na virtude de três refeições diárias, ele pode continuar petiscando o dia todo, mas seu hábito lhe parecerá, no fundo, tão estranho quanto o de Alice.
Com isso, Calvin e Alice transformaram sua vida de casal numa aventura fascinante: a aventura de sempre descobrir o outro, cuja diferença inesperada nos dá, de brinde, a certeza de que nossa obstinada maneira de ser, nossos jeitos e nossa neurose não precisam ser uma norma universal, nem mesmo a norma do casal. Há quem diga que oparceiro ideal é aquele que nos faz rir. Trillin completou a fórmula: Alice era quem conseguia fazê-lo rir dele mesmo. Com isso, ele descobriu a receita do amor que dura.

3 comentários:

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  2. O Segredo da vida de um casal... ... ... ... ... hummmmmm!!!!!!!!!!!!! não tem formúla certa... mas, acredito que pode está relacionado a saber um pouco de matemática (rsssssss)...
    Somar alegrias...
    Multiplicar amor...
    Dividir problemas...
    Diminuir diferenças...
    Isso tudo "matematizado" com grandes cálculos de respeito, compreensão, sabedoria para ceder na hora certa, calar-se no momento oportuno e até mesmo reconhecer o erro quando não se tem certeza que se está errado... Os Contos de Fadas quem fazem eles existirem, ganharem formas somos nós através do nosso imaginário... não quero ser A Bela Adormecida nem Branca de Neve nem A Pequena Sereia nem Rapunzel... deixo isso para o mundo mágico das crianças para que possam construir seu imaginário de sonhos e desejos e dessa forma entenderem ludicamente esse complexo mundo... mas, quero escrever a minha própria história digna de um Conto de Fada com direito até a final feliz... e quem sabe fazer como Calvin e Alice que descobriram através do respeito pelas diferenças encontraram uma forma fascinante de viverem a dois... Amar é... respeitar, compreender, aceitar, compartilhar...

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  3. Oi Paulinha, desculpe, precisei excluir o 1º comentário (expus particularidades mais do que devia)... bem mas vou deixar umas poucas palavras novamente:
    Entre idas e vindas, experiências boas e não tão boas, aprendi muitas coisas, procuro sempre aprender alguma coisa de bom... então como romântica que sou, continuo acreditando em casamento, amor eterno, e quem sabe até em um príncipe encantado (vczp! rs) ... sem dúvida o bom humor é essencial para que os relacionamentos sejam mais leves e feliz. Ao contrário do que dizem... Nem tudo que é bom, dura pouco! rs bjs.

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